sábado, 25 de abril de 2009

miséria

Miséria é miséria em qualquer canto. Miséria é, mas tem camadas que atuam em diferentes esferas. A miséria social nos engole e nos devolve sem olhos, em pele opaca. Então podemos dar ou receber esmolas, conselhos e orações, formando a urbe a zumbizar. A miséria do lixo, a miséria do luxo. Vejam quantos carros apressados, violentos; quantos cômodos vazios nas fortalezas da opulência; quanta roupa escondendo a pele fina; quanto remédio na farmácia, quanta doença na rua, quanta dor e quanta droga. Vejam as favelas, os bancos, a indústria bélica e a alimentícia. Miséria cultural, TV miséria, entretenimento-entorpecente. Miséria espiritual enchendo igrejas e shoppings. Miséria existencial moldando o comportamento, engordando corporações econômicas, contendo a vida numa rotina autômata. A miséria do corpo em clínicas de estética, fitness e bocas de crack. Átomos de miséria que o ser humano cultiva para constituir seu organismo social e sua vida miserável. Miséria é miséria em qualquer canto, o império do ser humano, grávido de vermes decompositores, vestido de arrogância e engano.
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colapso urbano


as nuvens estão regando
os cabelos dos homens
eles crescem como as passadas
que se apressam como ventania

gotas se batem
e rolam no asfalto
inundam cães e carros
curam bêbados

em seguida correntezas
levam camas e mesas
um pedaço da fome
um bolo de violência e uma pedra de crack

o chão treme
a terra arde
o fogo cai alucinado
na fantasia da chuva

cidade submersa em fantasia
da secura da vida
dum arco-íris doce
no colapso das horas

a cidade respira por aparelhos
escuta ao longe bebês chorando
pulsa em ondas que quebram
e mordem câmeras de TV

o sol desliga os aparelhos
a água se evapora como a vida
a noite escurece a tristeza
embala a esperança que sonha

o mundo é de pedra novamente
banhada de xixi de rato
lapidada por trabalho escravo
cortando
pés de infância

o vento sopra
a nuvem chove
o sol queima
o submundo sobrevive



(de poemas manifestos )
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deusesperança


das orações que você fez
qual foi ouvida?

quando bradou por chuva
veio a sede
quando clamou pela cura
veio a dor

farto de esperança
aplacou-lhe a decadência
desesperado
ganhou o silêncio

passou a vida
chorando no ermo
ouvindo os próprios soluços
ao açoite dos ventos

a divina providência lhe esqueceu
a tudo e a todos que pode tocar
e você é fiel
como uma máquina programada

siga pois na sua estrada
espere na morte
salvação que na vida não há
não pense em tudo
que tudo não cabe na sua cabeça

vai esquecendo
de ti, do mundo
que Deus é grande
o suficiente para preencher sua mente
até transbordar como a água dos seus olhos

e Este que transborda
vai formando o rio da miséria
desaguando no mar de gente
que corre com pavor
face a face com Satanás

Satanás é a cara do desencanto
migalha de opulência divina
a ressaca depois da farra
a caganeira depois da comilança
- o nome do que você tem
quando tudo lhe falta

você se sente amarrado
mas não vê o seu algoz
vocifera e resmunga
clamando por Deus
- o nome de tudo que sempre lhe falta




(de eu rexisto)
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a fome

o nada devora a essência
o vazio devora a existência



A FOME DEVORA O HOMEM


O HOMEM DEVORA CRATERAS



CRATERAS DEVORAM ASTROS



ASTROS DEVORAM A TERRA



A TERRA DEVORA PÓLVORA



PÓLVORA DEVORA FLORESTAS



FLORESTAS DEVORAM MÍSSEIS



MÍSSEIS DEVORAM FETOS




FETOS DEVORAM ÚTEROS



ÚTEROS DEVORAM ASAS



ASAS DEVORAM VENTOS




VENTOS DEVORAM O CAMINHO



O CAMINHO DEVORA NÉVOA



NÉVOA DEVORA SONHOS




SONHOS DEVORAM O FUTURO



O FUTURO DEVORA ROBÓTICA


ROBÓTICA DEVORA MENTES





MENTES DEVORAM O FIM



O FIM DEVORA O HOMEM



O HOMEM DEVORA


A FOME



(de eu rexisto )

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estado de miséria


os indigentes
pagam pelos doutores


(de anarcotráfego)

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favela existencial


há de ver cidades
mansões altivas
adversidades


(de anarcotráfego )






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